FONTAINE
Belo Horizonte,
quinta-feira, treze e vinte cinco.
Um longo congestionamento na Avenida Afonso Pena. Retorno
às aulas e o trânsito se torna ainda mais caótico no centro da cidade. Uma
mistura de carros, ônibus e pessoas na corriqueira agitação de uma capital.
Olhando de cima, um cenário totalmente perturbador. Segundo analistas, o
trânsito nos grandes centros urbanos é uma das maiores causas de estresse do
homem contemporâneo.
Fernando e Jorge Augusto voltavam do almoço, quando na
entrada da garagem do prédio onde trabalhavam, Jorge Augusto freou bruscamente
ao contato com uma mulher que pulou na frente do carro.
- Uma louca depois do almoço, vai me dar congestão! -
disse Fernando ao amigo enquanto esse descia apavorado, socorrendo a mulher que
jogada ao chão permanecia imóvel.
A pele morena num vestido de seda colorida e sandálias de
couro. Era uma daquelas mulheres que agarravam as mãos das pessoas no meio da
rua, querendo ler a sorte.
- Está bem? Machucou-se? Será que não viu o carro? Você pulou
na frente do meu carro, se está querendo morrer, pule na frente de um ônibus –
disse ele mostrando a fila de ônibus e carros parados atrás do seu carro que
impedia o fluxo normal, congestionando ainda mais o trânsito.
Silenciosa, aquela desconhecida ficou olhando para ele,
num olhar profundo e compenetrado. Irritado, ele a segurou pelos braços,
levantando-a. Uma pequena multidão logo se aglomerou no local, enquanto dois
policiais desviavam os motoristas.
Naquela confusão, a
misteriosa mulher segurou com firmeza as mãos de Jorge Augusto levando-as aos
seus robustos seios.
- Eu estava procurando você! Eu estava procurando você!
- Ei policial, não vê que se trata de uma louca! - disse
Fernando, puxando o amigo que parecia hipnotizado por aqueles olhos negros.
Jorge Augusto entrou no carro automaticamente, enquanto o
policial afastava as pessoas.
- Meu amigo, o que foi isto? Uma cigana pula na frente do
seu carro, oferece a você os seios e você quase baba! Talvez se der um bom
banho naquela mulher, quem sabe! Tem um rosto expressivo! O que acha?
Jorge Augusto sentia-se como se as veias do pescoço
fossem explodir. Afrouxou a gravata, sentia náuseas, pensou que ia desmaiar
naquele instante que colocava o carro na mesma vaga, algo que fazia a mais de
quinze anos. Uma puxada para a esquerda e risca toda a lateral do carro na
pilastra de cimento cinza.
- Jorge Augusto o que você tem? Tudo por causa de uma
maluca? Ela está viva, não teve nem mesmo uma escoriação. Olhe para o que você
fez com o carro!
Fernando desceu do carro, correu os olhos na nova BMW
preta, enquanto o amigo foi em direção ao elevador, como se nada houvesse
acontecido.
- Jorge Augusto olhe para seu carro, volte aqui! Você
arregaça o carro e faz de conta que nada aconteceu? Se não o conhecesse diria
que aquela mulher mexeu por demais com você! Jorge Augusto, eu estou falando
com você! O que há? Está bem, cara, você está pálido!
Jorge Augusto jogou a cabeça para trás como se lhe
faltasse ar.
- Eu também queria
ter colocado as mãos nos seios daquela mulher, ela deve ser de outro planeta
para fazer você ficar tão estranho! Isto tudo é carência? A patroa não está
dando conta do recado?
Jorge Augusto era diretor financeiro de uma importante
multinacional, foi eleito pelos colegas, o mais brincalhão entre todos os
dirigentes da empresa. Há menos de vinte minutos atrás, estava contanto piadas
em inglês para o grupo alemão e naquele instante entrava no elevador
extremamente transformado. Não dissera nenhuma palavra, para o desespero do
amigo que não conseguia entender o que se passava.
- Jorge Augusto, você está me assustando! Estou
preocupado com você! Aquela mulher mexeu tanto assim com você? Fale alguma
coisa cara! Ela está viva, o carro nem chegou a tocá-la. Pensando bem, se ela
queria chamar sua atenção, conseguiu em demasia! Não era o tipo de mulher que
atrai um homem como você, os cabelos longos, já imaginou as pernas dela debaixo
daquela roupa, uma mata Atlântica! Jorge Augusto está me escutando? Você está
tendo um enfarte?
Ele nada respondeu, mas via-se que não era um
enfarte. O elevador demorou mais que o normal. Nunca havia percebido quanto
tempo se perdia naqueles oito andares. Jorge Augusto parou ali.
-
Se cuida cara, até parece que viu a morte!
Nem mesmo o ar condicionado
podia aliviar o calor que exalava de seu corpo. Ajeitou a gravata, o terno azul
escuro, andou pelo corredor num silêncio que incomodou os que por ele passaram.
Até que enfim entrava em sua sala, local que passou a maior parte do seu tempo,
isto por quase meia vida.
O toque na porta, a mesma secretária, há mais de doze
anos. Estava cansado de ver aquele mesmo rosto todos os dias, não poderiam
deixá-lo em paz nem por um minuto?
- O contrato que o senhor me pediu, podemos revê-lo
agora?
Ele fez o sinal de negativo, acenando para que ela se
retirasse.
Marilda saiu dali um tanto sem entender o que poderia
estar acontecendo.
- Fernando o que aconteceu com o doutor Jorge Augusto?
- Ele bateu o carro.
- Não é a primeira vez que ele bate o carro! Eu perdi meu
almoço para redigir estes contratos urgentes e ele chega completamente
alienado?
- Descerei aí daqui a pouco para conversar com ele.
Deixe-o sozinho por um tempo. Isto é um mau sinal, é stress! Nosso futuro
garota está nas mãos dele.
Jorge Augusto trancou a porta, tirou o telefone do
gancho, colocou o terno sobre a poltrona, como sempre fazia. Entrou no
banheiro, ficou parado de frente ao espelho, o rosto pálido, talvez fosse o
cansaço, mais de três anos sem férias e o mais importante negócio de sua vida.
O futuro da empresa estava em suas mãos.
Ele era o único que poderia
fazer as negociações com o grupo alemão, tinha que convence-los a um negócio
que os próprios dirigentes sabiam que era inviável. Com todo seu know how era o único capaz de livrar a
companhia de uma falência. Muito dinheiro estava em jogo. Se fosse um sucesso
seria conquista da empresa, do contrário seria seu fracasso.
Mas não eram os alemães que o perturbava e sim a imagem
daquela mulher que ia se tornando mais nítida a cada instante, consumindo seus
pensamentos. A ânsia de vômitos, ele se sentia tonto, talvez uma intoxicação
alimentar, mas improvável, o restaurante era um dos melhores e mais
tradicionais de Belo Horizonte.
Reorganizou os papéis sobre a mesa, cerrou as persianas,
onde o sol já começava a bater. Nunca parou frente àquela janela olhando a rua
lá embaixo. Era um homem muito ocupado e como sempre frisava para seus
subordinados, que cada minuto vale ouro.
Jorge Augusto começou a observar o movimento de carros e
pessoas. De onde estava podia ver do outro lado da avenida, a tal mulher.
Quantos anos? Talvez trinta. Sentada no calçadão, lia a mão de algum curioso.
Sentiu quando ela levantou os olhos para cima, parecia estar lendo seus
pensamentos, que de ímpeto se afastou da janela de vidro escuro.
O coração batia mais rápido, soltou a gravata, um calor
subia pelo seu corpo, deixou-se cair na poltrona puxando-a para perto da
janela. Ficou olhando oito andares abaixo, quase que em miniatura, para uma
mulher de um olhar ofuscante, cabelos em desalinho, longos até a cintura, pele
bronzeada pelas ruas do mundo. As sandálias de couro, desprovida de qualquer
vaidade. Uma cigana, uma feiticeira, ou simplesmente uma mulher que num
instante conseguiu balançar o eleito pelas inúmeras amigas, o homem mais
simpático.
- Jorge Augusto é a última chance ou vamos arrombar esta
porta!
Até mesmo eu ficaria preocupada com aquele homem, parecia
estar sentindo mal. O suor escorria sobre seu corpo.
A maior conquista da sua
vida estava em jogo e ele trancafiado numa sala, sem qualquer indício de vida.
- Doutor Jorge Augusto, o Mr Johnson Herman já ligou
várias vezes. Os contratos precisam ser revistos. O Doutor Alfredo está
esperando para a reunião das quatro horas.
E nada! Como aquela voz o perturbava, como suportara por
tantos anos aquela mulher. Jorge Augusto parecia distante daquelas vozes
ansiosas. O que estaria ele pensando? O mal estar estava passando. Um desejo
indescritível de ver aquela mulher, de olhar para ela. Era como se a
conhecesse. Casado há mais de dezoito anos, nunca foi um santo, mas apesar das
tentações nunca traiu a esposa. Por que não poderiam deixá-lo em paz!
Abriu a porta para o alívio de todos.
- Agora não!
Entrou no elevador até o segundo andar, onde ficava a
segurança da companhia. Através de um binóculo pode vê-la mais de perto. A
misteriosa mulher levantou-se de onde estava há mais de três horas sentada numa
única posição, parecia inerte ao mundo, às pessoas que transitavam por ali.
Passou sensualmente as mãos sobre o corpo, como se soubesse que estava sendo
observado por alguém, cruzou os braços sobre os seios, libertando-os,
levantando-os para cima, como quem busca alguma força do alto, levou os braços
para frente, o sorriso bem nítido em direção a Jorge Augusto.
Um frio correu-lhe a
espinha. Aquela mulher sabia que ele estava por detrás daquelas vidraças
escuras, sendo consumido por um desejo infinitamente inexplicável.
Fernando chegou atrás dele:
- Ei cara, o que está acontecendo? Largue este binóculo!
É aquela louca do outro lado da rua, é ela? Você está traindo Anita? Só eu para
não perceber isto? A mulher jogou-se contra seu carro! Ah meu Deus! Isto não é
bom para a companhia!
-
Eu nunca vi antes aquela mulher, mas é como se eu a conhecesse.
- A paixão é linda! Mas antes pelo amor de Deus, volte à
realidade, cara! Nossa cabeça está em jogo!
- Não estou em condições de participar de nenhuma reunião
hoje!
- Brincadeira! Parece que não conhece a situação dessa
porcaria! Até se você morresse nós mandaríamos seu corpo vir para participar da
reunião. Não foi por acaso que escolheram você para esta negociação, se cair
fora agora estamos falidos!
- Dez minutos, eu volto já!
- Jorge Augusto não pode fazer isto...
Fernando segurou seu braço e Jorge Augusto, bem mais
forte que ele, o empurrou ao chão.
- Droga! Me deixem em paz!
Jorge Augusto sentia-se dentro de uma garrafa de champanhe,
preste a explodir. Desceu correndo pelas escadas de serviço. Atravessou a rua
entre os carros até o canteiro central, de onde ainda podia vê-la do outro
lado. Mas ao atravessar a outra pista, ela não mais estava entre as centenas de
pessoas que corriam de um lado para o outro.
Jorge Augusto olhou em volta, tudo em vão. Um pingente no
chão, FONTAINE. Teve certeza de que este era o nome dela. Segurou-o contra o
peito, sentindo novamente aquela sensação de tontura. Acenou para o táxi.
- Preciso encontrar uma
mulher!
- Pois não doutor, diga o
endereço!
A noite começou a cair quente e barulhenta. Jorge Augusto
pensou que o calor deveria estar corroendo seu cérebro. Permaneceu por mais de
quatro horas rodando as ruas adjacentes e nem um sinal dela.
- Achar alguém a pé neste horário, é como achar uma
agulha no palheiro. Eu sei companheiro que o senhor quem está pagando, por mim,
tudo bem. Mas já passamos por esta avenida umas dez vezes!
O taxista o deixou na entrada do condomínio onde vivia há
menos de dois anos com a família. Muitas vezes desejou caminhar ali, foi
visando isto que mudaram para aquele lugar cercado de muito verde, onde
excêntricas estruturas físicas se projetam magníficas ao longo da rua
principal. Agora o fazia, olhava distante para as pessoas que passavam por ele.
Nunca tivera tempo para
observar aquele cenário. Quanto dinheiro estariam por trás daquelas mansões?
Para que tudo aquilo? Era um luxo frio, conquistara ao longo da vida tudo que
desejou e agora estava sozinho. Talvez Marisa tivesse razão, estava precisando
de umas boas férias.
A casa parecia deserta. Demorou até lembrar-se que a
esposa e filhos estavam viajando, desta vez para onde mesmo? Sentiu-se aliviado
por isto. O telefone não parou de tocar, tirou o telefone do gancho. Uma noite
só para ele, precisava recuperar as energias, não compreendia o que poderia
estar acontecendo, mas sentia-se mais leve.
Tirou a roupa e pulou nu na piscina. A primeira vez em
cinco anos que entrava na piscina, sempre o trabalho a consumir até os momentos
de lazer.
A lua cheia, o silêncio, um
prazer que exalava na imagem daquela mulher misteriosa. Daria a vida para
encontrá-la naquele instante.
A garrafa de uísque, a casa parecia pequena demais para
conter sua inquietude. Sentia-se estranho, atordoado, tentava ordenar os
pensamentos, entender o porque daquele sentimento nunca antes sentido. Desde a
hora que vira aquela mulher, sentia que uma nova vida surgia dentro de si, ou
era apenas alucinação.
O êxtase de uma subida felicidade! Nu sobre o tapete da
sala, ele adormeceu em seguida, tão logo o sonho.
Numa roupa de militar de alguma região do mundo não
identificada. Possuía os mesmos traços que os atuais. Alto, os cabelos
castanhos, os olhos verdes, talvez um pouco mais magro, a fisionomia austera e
má.
A mulher misteriosa surgiu
bem mais jovem e bonita, totalmente nua. Era uma criança. Talvez uns doze anos.
Ele passou a arma no corpo daquela menina de olhar assustado e lágrimas nos
olhos. Tirou então as luvas negras e alisou cada centímetro daquele corpo
frágil. Os seios virgens, ela suplicou-lhe para que não fizesse aquilo. Quanto
mais tentava se esquivar mais a desejava.
O cabelo curto, a pele clara, os grandes olhos negros. Ao
redor da sala, armas, animais empanados, livros em desordem. Ele a puxou
bruscamente pelos cabelos e a amarrou contra a pilastra no centro da sala. Saliva
quente e ela lhe morde a língua quando a beija. O sangue jorrou farto. Ele
gritou, os homens entraram na sala e levaram a garota.
Jorge Augusto acordou quando em sonho viu as chamas
consumindo o corpo não daquela garotinha, mas daquela mulher misteriosa.
Um grito estridente, o sêmen sobre as coxas, o corpo transbordando
de suor.
- Eu enlouqueci! Eu enlouqueci!
Nada o fez tirar aquelas cenas tão nítidas de seus
pensamentos. A noite parecia eterna. Eram quatro horas da manhã quando chegou
ao escritório naquela sexta feira. Sentado perto da janela podia ver os
primeiros raios do sol a iluminar a sala em tons suaves. Nunca tinha observado
duas telas que ganhou de um artista argentino. Era por demais abstrata, mas
naquele momento conseguia ver o rosto daquela desconhecida estampada nas formas
indefinidas.
Eram cinco e trinta quando
olhando pela janela a viu no mesmo lugar do dia anterior. Por segundos não a
viu chegar. Estava sozinha, a rua ainda estava deserta. Algumas poucas pessoas
começavam a transitar por ali.
Ela olhava fixamente para
ele que se mantinha a observando pela fresta da cortina. Jorge Augusto sentiu
algo gélido correr suas veias. Uma força mais intensa que sua sóbria
consciência.
- Jorge Augusto, graças a Deus que está aqui! Deixou seu
carro na garagem e desapareceu, o porteiro não viu você entrar no condomínio
ontem à noite. Eu pensei que algo tinha acontecido, você nunca agiu desta
maneira! Jorge me desculpe, mas sua família está de volta. Chegamos a pensar
que fosse seqüestro, ou qualquer coisa parecida! O que tem a falar?
- Não tenho nada para falar, agora me deixe só! –
permanecendo indiferente de frente para a janela.
- Você deve ter enlouquecido! Jorge Augusto a reunião de
ontem foi cancelada, por sua culpa! O presidente nos deu o prazo máximo até
amanhã às quinze horas, do contrário vai abrir valência. Já pensou que nosso
trabalho de mais de quatro anos estará por água abaixo e os milhões de
investimentos, todos por este projeto.
Jorge Augusto parecia não ouvir, não mexia nenhum
músculo.
- Estou falando com você! Se
não convencer aqueles alemães nazistas a se tornarem sócios desta droga,
estaremos numa encrenca do tamanho do diabo! Uma auditoria e podemos ser
presos! Temos reunião às dez horas
- Tem um remédio para enxaqueca?
- Você andou bebendo? Está com uma cara horrível. Tome um
banho, troque esta roupa. O que poderia ser pior? Você descobriu que tem câncer
e vai morrer daqui uma semana?
- Preciso só de meia hora. Depois subo para a reunião.
- Desculpe-me se estou sendo egoísta, mas você conhece
melhor nossa situação.
Jorge Augusto trancou a porta, pegou o binóculo para
vê-la mais nitidamente. Estava usando a mesma roupa do dia anterior, um vestido
longo estampado. Encostada na parede de um prédio antigo continuava olhando em
sua direção.
Um arrepio percorreu-lhe o corpo. Aquilo não poderia
continuar acontecendo. Queria ir até ela, ao mesmo tempo, sentia um medo, um
receio, talvez o desejo de possuí-la.
- Doutor Jorge Augusto, a reunião, tem que subir
imediatamente, todos estão esperando o senhor!
A reunião, sim a reunião. Marilda falou alto, unas três
vezes, até que ele sai da sala, numa camiseta pólo azul. Ela correu atrás dele
entregando-lhe o blazer preto.
Dez homens sentados numa mesa oval. Jorge Augusto mal
cumprimentou aqueles homens que no dia anterior encantou com a receptividade e
poder de convencimento do diretor financeiro.
Jorge Augusto estava indiferente, introspectivo.
- O que acha Jorge Augusto?
- Não estou me sentindo bem! Me desculpem senhores, tenho
que me retirar!
- Mas que hora? – disse o
presidente da companhia num olhar de total
reprovação.
O que aquele velho queria
mais dele? A vitória não seria consagrada a ele? O
velho foi atrás de Jorge
Augusto.
- Se sair daqui agora, sinta-se despedido! Eu arruíno
você, seu desgraçado!
Jorge Augusto voltou-se para os homens sentados à mesa.
- Na realidade estes números
não representam a realidade desta companhia! O mercado tem caído
consideravelmente nos últimos anos, estou cansado de vender mentira só para
enriquecer o bolso de alguns miseráveis... Comprem se quiserem!
O que estava fazendo? Por
que falava daquela maneira? Não era sua voz, não era Jorge Augusto.
Fernando ainda foi atrás dele, e todos completamente
surpresos com a atitude do homem mais importante desta companhia.
Jorge Augusto desceu o elevador.
Olhava para o pingente com o nome gravado. Mais uma vez se arriscou no meio
daqueles carros, mas ela não estava do outro lado da rua. O céu acima dele
escurecera rapidamente. Viu quando o carro da esposa entrou no prédio. Tudo o
que menos desejava era dar explicações que nem mesmo ele compreendia. Acabava
de arruinar a vida de sua família. Mas isto parecia não ter importância.
O vento forte espantava as pessoas das ruas. Voltou a
garagem do prédio, pegou o carro. Começou a andar envolta do quarteirão. Ela
tinha que aparecer. Desejava vê-la mais que qualquer outra coisa no mundo.
Fontaine, nada era mais importante que estar com ela.
Uma esquina à frente, estava
ela acenando para seu carro. A chuva forte começou a cair, parou a menos de um
metro dela, via uma linda mulher, o vestido claro, colado ao corpo mostrava que
ela não usava absolutamente nada por baixo, o sorriso mais sensual que vira em
toda sua vida. O explodir de um desejo totalmente incontrolável.
Ele abriu a porta do carro. Olhou para ela bem de perto.
A mesma sensação de que já a conhecera antes.
- Estava esperando por você.
- Quem é você Fontaine?
- Quem fomos nós doutor Jorge Augusto?
- O que quer de mim? Por que pulou na frente do meu
carro? De onde você veio?
- Aos céus não questiona quem somos. Agora somos o presente
e tudo isto é o que importa. Vamos! – sua fala saía pausada, vibrante. Não
disse nada mais.
Era uma ordem, uma cumplicidade de pensamentos. Dirigindo
contra a chuva forte andaram alguns quilômetros fora da cidade. A mulher desceu
do carro, tirou o vestido, ficando completamente nua. Jorge Augusto desceu do
carro, aproximou-se dela. E ela tirou-lhe toda a roupa.
- Hoje você é meu escravo!
Puxou-o contra seu corpo, beijando-o com fúria,
mordeu-lhe a língua. O sangue jorrou farto, mas o prazer era mais intenso que a
dor. Ele jogou-a sobre a terra úmida penetrando-a com um louco desejo tão
desesperado como as cenas que vinham e iam ao seu cérebro.
Debochada ela começou a rir bem alto, enquanto ele não
conseguia parar com aqueles movimentos sobre o corpo daquela mulher, ou era o
corpo de uma menina que ele via?
Ela olhou para o céu, a chuva cessou tão rapidamente como
começou. Sussurrou algumas frases numa linguagem que não pude identificar. Vi
quando ela o puxou para dentro do carro, completamente nus.
Ela no volante. Jorge
Augusto parecia hipnotizado, quando o carro atingiu a velocidade de cento e
noventa quilômetros.
O caminhão inflamável logo à sua frente, o carro na
contra mão e o grande clarão que iluminou aquela noite que acabava de nascer meio
tímida pela chuva de verão.
Testemunhas juram ter
visto a mulher no volante, mas encontraram apenas restos de uma pessoa, que
após teste, era de Jorge Augusto.
E intacto sobre as chamas, o
pingente.
A lua cheia imperou sobre a noite, apagando todos os
vestígios da chuva. Uma energia vibrante e indescritível conduziu todos a
várias interrogações.
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Denia Dutra - 2001
5º Lugar - Categoria Conto